segunda-feira, 29 de junho de 2020

O significado de quando um famoso se assume...

Estamos no mês do Orgulho LGBTQI+ (no finalzinho mas ainda no mês) e antes de iniciar essa conversa tão importante, vamos entender porque Junho é o mês mundial do Orgulho LGBTQI+?


O mês de junho foi escolhido por causa da Revolta de Stonewall, que nada mais foi que uma série de manifestações violentas de membros da comunidade LGBT contra uma invasão da polícia de Nova York que ocorreu na madrugada de 28 de junho de 1969, no bar Stonewall Inn, no bairro de Greenwich Village, em Nova York. A rebelião durou seis dias e é considerada um dos eventos de luta mais importante para a conquista de direitos igualitários e de criminalização de atos de preconceito em diversos países. 


Beleza, estando cientes disso, vamos ao que realmente interessa: Por que é tão importante quando um artista “se assume” homossexual? Esse post originou de uma discussão bem calorosa em uma postagem da página @filmografiafrases no instagram. A postagem em questão trazia a seguinte frase: “Amybeth McNulty, de Ann With an E, se assumiu Bissexual por meio de sua conta no Twitter” a legenda da foto com duas imagens da atriz, uma como sua personagem e outra enrolada em uma bandeira LGBT, era apenas: “Maravilhosa”. Até aí estava tudo lindo e perfeito, vomitando arco-íris… mas eu tive a brilhante ideia de ler os comentários… Por que ó Senhor? Eu não aprendo nunca…


A internet está cheia de cagador de moral e regras que se acham donos da verdade absoluta e que acreditam que apenas suas verdades são de fato válidas, e em um dos comentários a pessoa disse o seguinte:


“Acho essa palavra se “assumir” tão estranha. Ela apenas disse o que ela é. Ela não precisa se assumir. Não há culpa, não há erro, não há satisfação pra dar a sociedade. Assumir é apropriar-se de algo, tomar para si algo, exibir. Não quero problematizar com isso que falei. Apenas que a gente possa repensar sobre essas questões que de alguma forma são excludente, porque os LGBTQ+ precisam assumir algo? Parece que havia algo escondido e que de repente decidiu revelar.”


Muito lindo, muito madura e esclarecida essa pessoa, mas aí eu vou perguntar a vocês, numa boa mesmo… Primeiro: Agregou a alguém esse tipo de comentário? Imediatamente me veio a mente: “militante de apartamento que quer biscoito na internet”. Eu poderia ignorar esse comentário e apenas apreciar a imensidão de pessoas deixando corações no post ou dizendo a famosa frase “e choca um total de zero pessoas”... sim eu poderia… eu fiz isso? Claro que não né. Eis a minha resposta:

“Eu também me sentia incomodada, até que passei a pensar na palavra "Assumir" como uma forma de declarar para si mesmo sua condição e se aceitar... Quando eu me assumi, o ato de fazer isso foi meio que um divisor de águas entre eu sentir aquilo, e passar a me aceitar e me respeitar por aquilo, assumir para mim mesma que estava tudo bem e que eu estava bem... acho importante quando famosos fazem isso publicamente pois ajuda quem os acompanha a verem que está tudo bem…”


Depois disso rolou mais discussões e no final eu cansei e deixei a pessoa falando sozinha, mas não deixei de pensar. Eu tenho 28 anos… chegando aos 29 na verdade, e me assumi aos 18 anos, ou seja, uma década neste mundo assustador onde ainda não somos vistos com respeito como uma pessoa hétero.


Eu gosto quando um artista se assume, pois mostra a todos os fãs desse artista, independente de idade, que está tudo bem ser gay, lésbica, bissexual ou seja qual for sua identidade de gênero e sexualidade, e esse aprendizado pode servir para a pessoa começar a se aceitar, ou para quem viu seu ídolo se assumindo, ver que o amigo, o familiar que se assumiu, precisa de apoio e carinho.


O ato de se assumir é mais do que chegar e admitir algo, é dizer todos os dias para si mesmo e para o mundo: “Eu sou lésbica/bissexual/gay e me amo assim”. Vivemos em uma sociedade onde ser gay não é visto com bons olhos, onde eu não posso pegar a mão da minha esposa na rua ou dar um beijo nela, pois vão me olhar torto, me ameaçar ou algo pior. Eu como mulher lésbica vivo em uma sociedade onde durante uma entrevista de emprego em 99% das vezes me perguntam ao ver a aliança na minha mão: “O que seu marido faz?” e eu entro em um dilema interno que precisa ser resolvido em segundos, onde eu respondo: “minha esposa trabalha com x coisa” ou eu me refiro a minha companheira como sendo do gênero masculino. Em alguns casos até o nome do meu “marido” eles perguntam.


Responder essa pergunta em uma entrevista é difícil porque eu não sei se vou perder a vaga de emprego por não ter a qualificação necessária, ou por ser casada com uma mulher. Sou formada em pedagogia e mantenho minhas redes sociais fechadas por receio que algum pai veja meu perfil ou minhas fotos com minha mulher (que são poucas pois evitamos nos expor) e eu acabe perdendo o emprego, pois o preconceito ainda é enorme.


Uma das primeiras personagens da nova geração que eu acompanhei e que eu amo do fundo do meu coração, é a Alex Danvers, irmã da Supergirl na série da CW, que no início da 2ª temporada nos trouxe um pouco mais sobre o processo de se amar e se respeitar. No episódio 5 (Fogo Cruzado) aos 38:43 min ela fala para Maggie Sawyer que a conversa de ambas a fez pensar sobre ela, sobre a vida e os relacionamentos e o que ela sentia quanto a intimidade com os caras com quem se envolveu.


No episódio seguinte (ep. 6 da 2ª temp), aos 10:07 temos uma das cenas que mais me representou e me tocou, que foi os sentimentos expressados por Alex, do momento que “caiu a ficha” de que ela gostava de meninas e se assume para a irmã. Assistam a seguir:




Link para o canal do youtube de onde o vídeo foi tirado:

https://www.youtube.com/channel/UC8jG8NQz7ZHHI8hJVmKiANw


Esse episódio foi ao ar na TV em 2016, e no dia 08 de junho de 2020, a atriz que interpreta a Alex, a maravilhosa Chyler Leigh postou um comunicado em seu instagram com os seguintes dizeres:

TRADUÇÃO LIVRE: “Oi amigos. Hoje recebi uma manifestação de amor e apoio por me reconhecer e me amar como a pessoa que realmente sou. Uma vez que enfrentamos o nosso verdadeiro eu, podemos ver melhor o mundo ao nosso redor, bem como como podemos fazer uma mudança positiva e duradoura em prol da igualdade e do amor. Sou grato por ver com mais clareza, respirar um pouco mais fácil e tenho orgulho de contribuir com tudo em que acredito com um coração aberto e honesto. Enviando amor a todos”


Chyler, nossa eterna Lexipédia (Grey’s Anatomy) e Alex Danvers (Supergirl) se assumiu bissexual. Em algumas entrevistas ela contou como a personagem a ajudou a compreender esse tipo de sentimento, e quanto foi emocionante para ela, fazer a cena em que Alex se assume, o quanto aquelas palavras foram um alívio sobre o que ela mesma sentia. Chyler é casada desde 2002 e tem 3 filhos.


Eu posso dizer a todos, que não é fácil se assumir, que da medo, medo da rejeição, de que as pessoas não te olhem da mesma forma, que interpretem de forma equivocada suas ações, e fico imaginando o peso disso para alguém público como a Chyler… Uma parte da audiência de Supergirl abandonou a série depois que Alex se assumiu em 2016, muitas pessoas foram nas redes sociais ofender o programa, fazer ataques pesados a atriz… imagina se em 2016 quando foi ao ar, Chyler tivesse contado sobre si? Uma das coisas mais dolorosas de se assumir, é ver pessoas que você acreditou gostarem de você, virando as costas e se afastando, agora imaginem isso exposto para o mundo inteiro, com milhões de estranhos te julgando e te atacando… Imagine você perdendo oportunidades de emprego por que algumas emissoras não querem seus nomes vinculados a gays por medo do que a audiência vai achar…


Quando um ator/atriz ou qualquer celebridade vem a público e fala: “Sou gay”, “Sou lésbica”, “Sou trans” ou qualquer outra denominação da comunidade, esse é o momento em que devemos nos unir para bombardear essa pessoa de amor e carinho, porque o que esse alguém teve que enfrentar para dizer isso publicamente, tem um peso gigantesco, e todas as vidas que essa pessoa tocará ao se assumir, pode ser a salvação de alguém que estava prestes a desistir de tudo por se sentir um estranho… Ao ver seu ídolo se abrindo, se mostrando um de nós, nosso coração se aquece, pois passamos a ser representados na mídia, e caramba… representatividade importa demais!


Eu sei que nenhum artista vai ler esse post, mas se você que está lendo (partindo do pressuposto que alguém se dá ao trabalho de ler o que trago aqui) se você chegou a esse blog, e tem dúvidas sobre o que sente, pensa, se tem medo, vergonha ou acredita que não é bom o suficiente, queria que soubesse que você é sim importante e especial, independente de sua condição sexual, gênero ou etnia, você é perfeitx como é, e não está sozinhx.


Eu brinco que cada vez que um famoso se assume, uma fada nasce, e cabe a nós, sufocar essa fada de amor para que ela possa contaminar o mundo com sua coragem e verdade.


Seja você, a diferença no dia de alguém, o mundo é doloroso demais para deixarmos de vibrar cada vitória que temos, não perca seu tempo militando coisas sem nexo ou proferindo “lições de moral”. Você deve sim, sempre expor sua opinião, desde que ela não seja usada para ferir outra pessoa, e respeite o posicionamento do outro, mesmo que não concorde. Debater é diferente de julgar e acusar.


Antes de escrever sobre alguém, pense pra si mesmo: isso vai agregar a vida dessa pessoa? Vai agregar a minha vida? Se qualquer uma das respostas for não, desista. Coisas negativas não agregam, e apenas diminuem a alegria de muitos que encontram nas redes sociais, o acalento para dias sombrios.


Beijos e obrigada pela paciência,


Nos vemos em breve (eu prometo).