domingo, 10 de fevereiro de 2013

O Retorno

Boas tardes pessoal...
Durante pouco mais de um ano, escondi-me atras de medos, e parei de escrever...
As coisas mudaram um pouco depois do que aconteceu no dia 27 de janeiro de 2013 na boate Kiss em Sta.Maria... Marco então o meu retorno, com um desabafo sobre o horror acontecido naquela madrugada, que tanto chocou não só os gaúchos, mas como todo o Brasil.
" Eu estava lá
Eu vi o fogo
Vi a dor
A fumaça me sufocava
Tirei a blusa, coloquei no rosto
o branco ja dominava o ar.
Eu nada mais via,
Apenas ouvia, gritos por toda parte
Segurei a mão de minha irmã,
a caçula da família, a futura médica...
meu bebê...
e então ela desmaiou.
As pessoas se empurravam, arrastavam amigos já inconscientes.
Peguei minha menina nos braços.
Enquanto muitos corriam para o banheiro,
em meio a escuridão e a fumaça
corri em direção a porta de saída.
No caminho tropecei em corpos.
Não só corpos de adolescentes,
mas corpos de amigos, colegas...
e então, o corpo de meu primo.
Deviamos todos estar num churrasco com amigos,
mas a sede pela festa, pela balada, nos levou aquela boate.
Coloquei minha irmã sobre o ombro direito, e com a mão esquerda,
segurei o braço de meu primo, e continuei seguindo para a saída.
Quando finalmente cheguei a porta, meus olhos se fecharam,
sem que eu pudesse evitar. Por alguns segundos ainda,
pude ouvir gritos, sirenes, mas logo o mundo silenciou.
Senti-me leve, e estranhamente feliz.
Por alguns segundos cheguei a pensar que o que acontecera na boate,
não passara de um pesadelo.
Então senti-me puxado e vi a pior cena de todas.
Meu corpo estendido no chão, sem vida.
Não podia ser possível,
eu havia saído, lembro-se de carregar minha irmã e meu primo.
Olhei para minhas roupas. Vestia branco e estava descalço,
no entanto via meu corpo a minha frente, calça jeans, sem camisa.
Foi então que lembrei-me de minha irmã.
Corri entre os corpos estendidos na calçada, a procura dela.
Deixaram-na próxima a ambulância.
Firme, entre seus dedos, o celular que tocava insistentemente.
Eu não podia acreditar, não minha irmã...
Um bombeiro que atendia um rapaz perto, se aproximou e pegou o celular.
107 chamadas perdidas.
O homem tirou o pulso de minha irmã e fez sinal para outro homem, que se aproximou correndo
O celular voltou a tocar. O bombeiro atendeu, se apresentando como Sargento:
'- Sua filha está viva, estamos levando-a para o Hospital Universitário.'
Sorri aliviado.
Eu havia conseguido salva-la, mesmo que isso tenha custado minha própria vida.
Havia cumprido minha promessa de protegê-la.
Pouco a pouco os espiritos de meus colegas e amigos,
levantavam-se confusos, tentando consolar-se uns nos outros.
Com o nascer do sol senti um calor em meu peito. Fiquei ao lado de meu corpo.
Comecei a ouvir sussurros, e vi que os outros, também podiam ouvi-los.
Tratavam-se de rezas.
Um a um, fomos envolvidos por uma forte luz,
e as 230 almas que choravam sobre seus próprios corpos,
finalmente encontraram a libertação...
O povo, num gesto de solidariedade, sentindo a dor de nossos pais, irmãos e amigos,
haviam espiritualmente nos socorrido.'
                                                                   05 fev 2013
                                                                               ~~ Fênix ~~

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O que achou do post? Alguma dica de matéria?